Ora então, aqui temos mais uma crónica dos “Duendes na Estrada”, a relatar mais uma pedalada longa a meio da semana, como mais convém ao trabalhador do comércio.
De facto, a crónica começa poucos dias antes, numa saída numa madrugada de Quinta-feira para fazer 80 quilómetros até à Nossa Senhora do Salto, com regresso a Matosinhos por Valongo. Esta volta, para dois dos membros do micro-pelotão que depois pedalou até Caminha, foi uma espécie de prelúdio. Para os outros dois foi mais um interlúdio, porque, uns dias antes, tinham pedalado os 200 quilómetros do Brevet Randonneurs Mondiaux do Alto Minho, de que falámos neste postal e do qual ainda estamos à espera de crónica.
Apesar da ida à Senhora do Salto ter feito parte das voltinhas semanais do Pelotão do Arrasto, que por serem mais ou menos iguais umas às outras, não têm merecido grande destaque aqui na Gazeta, convém que esta fique registada por causa de três lições que se aprenderam:
Acabadas as lições, importa voltar ao tema da crónica. Os duzentos quilómetros sem melhor objectivo que ir comer uma pizza a Caminha. Desta feita, o pelotão foi constituído por algumas das caras do costume nestas coisas dos Duendes na Estrada. Os valentes foram o Sr. Teixeira, o Homem sem um nome com três letras e o Velho Lau, ao qual se juntou o Adolfo, o ciclista errante. O check-in foi feito às 7h30 da matina à porta da Megastore do MMM.
– Barbóti, hoje cheguei primeiro que tu. Já é a segunda seguida, ah? – disse o Adolfo, sempre chateado por o pessoal o tirar da cama antes de serem horas decentes para se fumar um cigarro. O Sr. Teixeira já lá estava e minutos mais tarde chegou o Homem sem um nome com três letras, completando o pelotão.
– Ui, Bárboti, vocês vão cheios de sacos… o que levam aí? – gemeu o Adolfo, admirado.
Entre o Lau, o Sr. Teixeira e o Homem sem o vocês sabem o resto, havia de tudo: impermeáveis, ferramentas, baterias extra, barritas energéticas tipo broinha de mel, mini-sandes de marmelada, frutos secos e litros de Isostar.
O Adolfo tinha tudo o que precisava para um dia na estrada. Um sumo e um maço de SG Ventil.
Contas à bagagem feitas e siga para Norte, em direcção à N13. A viagem nesta primeira fase não teve grande história, a não ser o mau gosto para urinar deste pelotão. É que se conseguiu parar nos piores sítios possíveis e uma das vezes até deu para aliviar contra um muro, a olhar para sanitas embaladas numa casa de materiais de construção.
A primeira paragem como deve ser foi nas Clarinhas de Fão, obviamente. É estranho como um dos principais pontos de paragem dos ciclistas que fazem esta rota ainda não se decidiu a vender água engarrafada em tamanho que se veja.
A segunda etapa foi sempre a pedalar até Viana do Castelo. Logo à saída de Esposende, o pelotão partiu-se em dois: o Lau foi indo um pouco à frente com um ciclista que ia a passar a caminho de Santa Luzia, o resto do pessoal ficou para trás à conversa com um ciclista de outros tempos, montado na sua Vitus que ainda reluzia e que veio com o pessoal até à ponte Eifel, onde se apresentou. Chamava-se Sr. Teixeira, tal como o Sr. Teixeira.
Logo à saída de Viana, a modos de pequena vingança por certos e determinados festivais, o Velho Lau decidiu levar o pessoal pelos caminhos rurais ao lado da N13. Bastante paralelo, ou como o pessoal gosta de dizer, pavê, a pensar com carinho nos pneus 700×23 do Adolfo.
– Pessoal, não desmoralizem e façam a vossa homenagem à Volta à Flandres e ao Paris – Roubaix, que estão aí à porta.
– Meus, a esta velocidade a média do Strava vai ficar um nojo, alguém disse.
– É da forma que aproveitas a paisagem. E se estás numa de social-coiso, aproveita para melhorar o Instagram – esta foi metida à pressão, para se fazer a devida publicidade, recomendando o hashtag #velocultureporto que costuma acompanhar as voltinhas do Pelotão do Arrasto.
Antes de Afife, o pelotão regressou à N13, indo directo a Âncora, onde desviou para a estrada velha até Moledo. Nessa altura, ainda não contente com a carnificina no paralelo, o Lau desafiou:
– Como é? Está quase na hora do tacho. Querem fazer o resto do caminho com rapidez, ou com emoção?
Quem acompanha a Gazeta do Ciclista, sabe que os duendes nunca fazem os melhores caminhos para as bicicletas fininhas e por isso mesmo, o pelotão lá engatou pelo meio do pinhal do Camarido até à Foz do Minho.
Nos primeiros metros a areia fez estragos, com paragens abruptas e canelas esfoladas nos pedais, mas depois, apanhando-se a manha, foi-se em ritmo ligeiro, apesar do grupo se ter organizado por grossura de pneu: os 700×32 do HSUNCTL, os 700×28 do Velho Lau, os 700×25 do Sr. Teixeira e, lá ao longe, os 700×23 do Adolfo.
Chegados ao final do caminho, as contas estavam saldadas e toda a gente estava com vontade de repetir.
A próxima paragem foi em Seixas, ponto onde quem vem do Porto faz 100 quilómetros. É a outra ponta da piscina, para quem vem com o objectivo de fazer os 200.
Dada a cambalhota debaixo de água, logo se iniciou o regresso, com paragem para almoço logo ali ao lado, no “Torre”, em Caminha, para as abençoadas pizzas, antecedidas de sopa de legumes e regadas a litros de coca-cola e vinho tinto. O restaurante é simpático e tem uma esplanada lateral, onde deu para guardar as bicicletas. O dono, também ele ciclista, não perdeu a oportunidade para conversar sobre a sua paixão.
Almoço terminado e depois de o Adolfo amansar um SG Ventil, o pelotão lá se fez à estrada, trazendo por companhia uma digestão pesada, que veio a moer tudo até bem depois da Foz do Neiva e que obrigou a ir menos rápido até Viana, uma paragem habitual para dois dedos de conversa com o amigo Rafael.
A paragem seguinte foi em Fão, do outro lado das Clarinhas para… comprar água. Já na estrada para o esticão final e depois de mais um SG Ventil, o Adolfo descolou do resto do grupo que só o voltou a ver já em Matosinhos, a chegar um bom bocado atrasado. Como ia à frente sozinho, enganou-se no caminho e deu uma volta maior do que era esperado. A lebre e a tartaruga, portanto.
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