Hoje fazemos oito anos de portas abertas, aquela idade meio adolescenta na vida de uma empresa: não somos novos, mas estamos longe de sermos velhos. Estamos cheios de dúvidas e inquietações. Este pequeno texto é se calhar um pouco passivo-agressivo para quem faz anos, mas acaba por ser uma espécie de editorial com uma reflexão sobre o que nós, pequenos retalhistas locais, estamos aqui a fazer. E para o sentido que faz estarmos, perto da da segunda década do século XXI, a vender bicicletas diretamente para a rua. Aqui, na Velo Culture, achamos que faz muito e os nossos colegas que teimam em manter as portas abertas também. Felizmente, a maioria dos nossos clientes alinha pelo mesmo diapasão e tu, se estás a ler isto, provavelmente também. De qualquer forma, não leves o texto muito a sério, mas não deixes de pensar no que aqui vai ser escrito.
Os motivos mais óbvios para escolher uma loja local em vez do mastodonte online ou do dealer obscuro do eBay, estão relacionados com o incentivo da economia local e a ajuda à manutenção dos postos de trabalho, porque a loja de bicicletas e respectiva oficina são importantes para a dinâmica do teu bairro, os seus impostos são pagos localmente e a força de trabalho é também ela local, provavelmente incluindo um ou dois amigos teus.
Outro motivo é o papel desempenhado pelas lojas e oficinas num contexto da mobilidade urbana em bicicleta. Com o número crescente de bicicletas nas nossas ruas, espaços de proximidade para resolução de problemas são muito importantes para manter todas as rodas a rolar. Infelizmente, nenhuma loja vive apenas dos serviços de oficina e por isso, ao comprares na tua casa preferida, não só estás a apoiar a sua actividade, como toda a comunidade ciclista.
As lojas, principalmente as pequenas e de nicho, fazem também normalmente parte do corpo ativista local, contribuindo para o debate e para o aumento da pressão para a melhoria de condições, tanto para quem se desloca diariamente de bicicleta, como para quem a utiliza para lazer. São também um saudável ponto de encontro da comunidade, onde muitas vezes há uma fresquinha ou um cafezinho à espera de quem vier para ficar mais algum tempo.
Em meados em 2011, quando começámos a planear a criação da empresa, o cenário era muito promissor. Havia muito menos gente a pedalar na cidade, é certo, mas havia uma atmosfera mais positiva em torno da bicicleta, que no resto da Europa se começava a afirmar como uma força imparável. Foram muitos os projectos que se lançaram nesta altura, foram poucos os que sobreviveram.
A criação da Velo Culture há oito anos está intimamente ligada ao movimento ativista aqui na Querida Imbicta e a preocupação com a melhoria das condições para os ciclistas e a luta por um consumo mais responsável continuam a ser as forças que nos fazem andar para a frente e a abrir as portas das Megastores todos os dias. Quero dizer, todos os dias, menos os Domingos.
Em 2015 fizemos um pequeno filme a falar do que nos motiva. Hoje, com outros actores, a motivação é a mesma.
Deixando o apelo ao teu lado mais altruísta de lado, deixa-me contar o que, ao longo destes oito anos aprendemos relativamente às compras online e ao que também estás a comprar quando compras uma bicicleta online:
- um caixote com peças que vais ter que montar sozinho ou arrastar até à loja mais próxima para ser montada, perdendo uma boa parte da poupança. Montar uma bicicleta não é tão fácil como te possa parecer e, se alguma coisa se estragar devido a uma montagem deficiente, não vais ter direito à garantia. Assistir a algumas das nossas aulas de mecânica pode ajudar, mas não vai resolver tudo.
- o risco de surpresas quando abres o dito caixote. Acredita, são muitos os casos em que há problemas no transporte que danificam a bicicleta ou peças importantes, que são facilmente resolvidos pela loja que tem a logística preparada para devoluções e substituições do material, mas que podem ser uma dor de cabeça para ti;
- o risco de perder dinheiro com a garantia, porque a devolução de uma bicicleta é coisa cara, principalmente em envios para o estrangeiro. Para piorar a situação, a tua fiel amiga tem que viajar devidamente desmontada e acondicionada dentro de uma caixa própria, que não é algo que se tenha guardado em casa;
- a perda do serviço associado à venda, que, no médio e longo prazo, vale muito dinheiro. Começando pela montagem, passando pela gestão de garantias e, no nosso caso, pela oferta vitalícia da mão de obra. Não é raro os nossos clientes terem os nossos contactos directos, o que é útil para desenrasques de última hora ou emergências. Mesmo no caso das peças e acessórios, por exemplo, o que não há em stock num dado momento é relativamente fácil de conseguir por uma loja em poucos dias, demorando muitas vezes menos do que uma encomenda online, ainda por cima sem custos de envio e com um serviço de aconselhamento associado.
Voltando ao aniversário, são então oito anos. Venham mais oito, esperando que por essa altura, menos adolescentes e mais sábios, o discurso seja já diferente e que a bicicleta esteja, de facto, em todos os cantos da cidade e que haja uma rede de pequenas lojas como as nossas para ajudar todos os novos e velhos ciclistas.
____________
Já que aqui estás:
Como sabes, é cada vez mais complicado para empresas pequenas e locais como a nossa chegar a todos os que têm interesse no que fazemos e escrevemos.
Uma forma excelente de não estares dependente dos humores algorítmicos das redes sociais para saber as novas dos duendes da Velo Culture, é subscrever a nossa newsletter. São dois emails por mês com um resumo do melhor que por aqui passou e mais algum conteúdo exclusivo. Os teus dados não serão utilizados para mais nada que não seja o envio da nossa Gazeta do Ciclista.
Email*