Texto: Lau. Fotografia: Velo Culture
Um destes dias, aquela que foi uma das últimas chuvadas desta Primavera obrigou-me a deixar a minha Raposa Indolente a dormir na loja do Palácio de Cristal e a regressar a Matosinhos de autocarro e Metro. Nada de grave, trazia o que ler, não é por não se pedalar uma vez que vem grande mal ao Mundo e uma vez não são vezes. Quer dizer, para esta vez não serem vezes, tinha ainda que resolver o problema do regresso de Matosinhos ao Porto no dia seguinte, o que foi conseguido da melhor forma possível.
Poucos dias antes tinha vendido a minha Titan e o negócio envolveu a sua troca por aquela que é uma das minhas bicicletas preferidas de sempre. Gosto tanto dela, que a Raposa tem, de facto, motivos fortes para tremer de ciúme. Trata-se da Olive, uma Velorbis Student Balloon que fez parte do primeiro lote de bicicletas dinamarquesas muito boas e muito bonitas que chegou à Velo Culture, já lá vão uns bons anos.
Então a situação é a seguinte. A Olive é minha e, o melhor de tudo, o dono anterior usou-a mesmo muito pouco. Está como nova. Foi-lhe feita uma revisão completa e era então necessário fotografá-la para a pôr à venda, que isto foi mais um affaire do que outra coisa, a Raposa me perdoe.
Tendo ainda o problema do ir trabalhar para resolver, decidi trazê-la de Matosinhos para o Porto e tirar as fotografias pelo caminho, que começa em Matosinhos e segue até ao centro do Porto pela Marginal, até à Restauração. Estava uma manhã daquelas que só nós sabemos, com uma luz um bocado descontrolada, mas linda. Tinha chovido e ainda ia chover outra vez. Senti-me abençoado por poder pedalar neste percurso pelo menos duas ou três vezes por semana, nos dois sentidos.
Nessa altura lembrei-me do que tinha lido na última Monocle, a da mobilidade. Um arquitecto chamado Alan Maskin diz que o seu commute é como ir de féria duas vezes por dia. Ele mora numa das muitas ilhas de Elliot Bay e trabalha no centro de Seattle. O seu dia começa com uma viagem no seu carro eléctrico até ao terminal do ferry boat, seguindo-se uma viagem de 35 minutos a ler ou a ouvir podcasts na quiet room do barco e depois uma pedalada numa bicicleta partilhada até ao trabalho. Segundo ele, o cenário é espectacular e vir de tão longe não é um problema, é como ir de férias duas vezes por dia.
Eu, só tenho que me sentir, pelo menos, igualmente afortunado. Apesar de envolver demasiados clichés da Querida Imbicta, pontos demasiados vistos e demasiados fotografados, este é possivelmente um dos melhores cenários urbanos do Mundo para pedalar. E só quem é de cá sabe o que é esta luz.
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Se gostaste deste postal, talvez te interesse ouvir a primeira cassete da Gazeta do Ciclista, que foi dedicada precisamente a estas mini-férias diárias. Está aqui.
A Olive está, neste momento, reservada.
Podes ver mais fotografias neste álbum no Flickr do Lau.